Tuesday, January 16, 2007

||Crónica|| Aborto - "Sim" ou "Não"?

Hoje, ao verificar a minha caixa de correio electrónico, deparei-me com uns quantos mails “moralistas”, com mensagens pró-vida e lembrei-me de que o dia 11 de Fevereiro se está a aproximar – o referendo sobre o aborto está à porta.Este será já o segundo referendo realizado em Portugal em torno deste controverso assunto.
Tenho a minha opinião formada - estou “a favor do aborto”, e passo a explicar a razão das aspas. Habituamos-nos a discutir a questão a partir da expressão: “sou a favor” ou “sou contra o aborto”. No entanto, prefiro falar do assunto usando os termos correctos – despenalização da interrupção voluntária da gravidez. Creio que nenhum ser humano, no seu perfeito juízo, afirmaria ser “a favor do aborto” (mesmo os que são a favor da despenalização…), pois, só quem nunca praticou, ou quem nao consegue imaginar o quão fragilizante é um aborto, poderia afirmar tal coisa (sem mencionar que abortar implica, à partida, um possível tráuma que perdurará toda a vida).Antes de mais, quero salientar a magnitude da importância que, na minha opinião, este assunto acarreta. As inúmeras discussões e debates acabam, no fundo, por banalizar algo que merece ser tratado com a maior seriedade.Independentemente do resultado do referendo, os abortos, clandestinos ou não, continuarão a ser praticados. A grande diferença que uma legalização poderá instalar é a possibilidade de o processo se realizar em condições de higiene, logo, com menos riscos de vida para quem o pratica.O “sim” à legalização do aborto não pode ser igualado ao “não” à vida! Não se trata disso. Trata-se de tornar o processo menos perigoso para as mulheres. Se alguém tiver de interromper uma gravidez, com ou sem a aprovação do Estado, interromperá a gravidez. Terá de corer é mais riscos. Muitos mais!Acho hipócritas slogans do género “Diga sim à vida!”, ou então afirmações de cariz religiosa, segundo as quais ninguem tem o direito de decidir sobre o direito de vida de alguem, excepto Deus! Vejamos uma coisa. O artigo 142º do Código Penal prevê a aprovação do aborto em caso de perigo de morte, de grave ou duradoura lesão para a saúde da mãe e em caso de violação, entre outros. Muitos dos “não-abortistas” concordam com a lei actual (digo isso uma vez que li vários textos publicados por pessoas que tomaram esta posição), pelo que não toleram a ideia da mudança. Ora, nesses casos, a vida do bébé parece já não ter tanta importância. Onde é que fica, então, o “Ninguém decide, excepto Deus!”?Uma legalização do aborto não virá substituir os métodos contraceptivos, e isso parece algo que muitos ainda não conseguiram perceber. Não, não pssaremos a organizar saídas “de amigas” à noite, com aborto incluído pela manhã!
Voltando à questão da Religião, para a maioria, senão mesmo a totalidade das Igrejas, o aborto é um crime intolerável contra um inocente indefeso. Para os não-religiosos é não só o recurso extremo para uma gravidez indesejada, como ainda uma forma de proteger a mulher contra o aborto clandestino que quase sempre deixa sequelas e muitas vezes ceifa vidas. Considero que o aborto devia ser legalizado mesmo por uma questão de justiça perante os não-religiosos em relação aos crentes. Sim, justiça, porque se a legalização do aborto não obriga a mulher religiosa a fazê-lo, a sua proibição impõe que a mulher não religiosa tenha o filho que não deseja!Uma afirmação que não me deixou indiferente pretence a João Titta Maurício - Vice-presidente da CPD do CDS-PP de Setúbal -, numa crónica “a título exclusivamente pessoal”: «(…) se o corpo da mulher é dela, é dela o direito a impedir a gravidez... não o de eliminar o resultado da gravidez! Como se um produto com deficiência que se "encomendou" durante uma irresponsável sessão de puro divertimento!». "Sessão de puro divertimento"? O que esse senhor faz é esquecer-se de que os métodos contraceptivos nem sempre funcionam! A medicina (ou a farmacêutica) também falha.Há quem diga que o feto não sente, nem sofre. Outros dizem que o feto não é, ainda, a criança que vai ser. A resposta assente na religião é que o feto é já em si não a criança, mas o homem portador de uma alma que ganha na altura da concepção, não do nascimento. E embora nada disto seja demonstrado pela ciência, o problema aqui é outro – crime ou não, o aborto continuará a ser praticado. A sua proibição não traz qualquer diminuição à sua prática, e certo é que a sua legalização poderá vir a diminuir o catastrófico da morte e inutilizações.E há ainda um outro aspecto que considero igualmente importante na questão da despenalização do aborto – a responsabilidade não é apenas da mulher, é e devia ser também do homem. Ao contrário da mulher, um “futuro pai” já não corre o risco de ser preso por “apoiar” a mulher no aborto... Mas, para evitar entrar em assuntos de natureza sexista, ficarei por aqui.
Foco à espera do referendo e, apesar de não alimentar expectativas muito optimistas, espero que o resultado me venha a surpreender…

0 Comments:

Post a Comment

<< Home